A fama de Manfred von Richthofen, o Barão Vermelho, fez justiça ao mito criado durante e após a Primeira Guerra Mundial. Mas é fato que ele não teria sido o que foi se não fosse convocado pelo ás Oswaldo Boelcke para integrar a Jagdstaffel (ou Jasta) 2. Quem era realmente Oswald Boelcke, aquele jovem piloto alemão que revolucionou para sempre a aviação de guerra, dando finalmente destaque e certo status para os pilotos de combate? Sem dúvida, Boelcke foi o pioneiro dos combatentes aéreos e suas estratégias de ataque e defesa são até hoje estudadas pelos pilotos modernos mesmo com seus caças equipados com alta tecnologia. A seguir uma breve resumo sobre a vida de Oswald Boelcke.
Boelcke, brilhante também nos estudos |
Família, saúde e academia militar – Oswald Boelcke nasceu em 19 de
maio de 1891 em Glebichenstein, próximo a Halle, na Alemanha. Era filho de um
professor de ensino médio. Seus três irmãos mais novos nasceram na Argentina,
onde seu pai lecionou por algum tempo. Boelcke sempre teve a saúde fragilizada
devido à problemas com sua asma e para fortalecer seu sistema
cárdio-respiratório começou a praticar natação, ginástica e tênis. De família
nacionalista, Boelcke se integrou na Academia Militar aos 13 anos quando teve
sua solicitação atendida pelo Kaiser (Imperador) Guilherme II. Boelcke foi um brilhante estudante, se
destacando em física, química e matemática. Quando se formou como cadete, foi
transferido para o Batalhão de Telegrafo nr. 3 em Klobenz.
Primeiros contatos com um avião – Em 1914 é transferido junto a seu irmão mais velho, o capitão
Wilhelm Boelcke para a recém formada Halberstadter Fleigerschule, a escola de
Vôo de Halberstadt. Ainda nesse ano, recebeu treinamento de voo de maio a
agosto, se formando como piloto em 15 de agosto de 1914.
A realidade da aviação Militar no
início do Século XX – Os aviões no início do século XX eram modelos
biplanos ou triplanos com estrutura de madeira, entelados (cobertos com pano).
Eram monomotores e sua baixa velocidade e sua ótima condição de planagem os
credenciavam sobretudo para voos de reconhecimento, aliás, essa seria sua única
função no começo da primeira guerra. Quando ocorria eventualmente um encontro
entre lados opostos nos ares, as armas pessoais (pistolas) dos pilotos ou
observadores é que decidiam quem permanecia voando e quem se espatifava no
solo. Com os crescentes confrontos nos céus, as armas pessoais foram
substituídas metralhadores manejadas pelo observador que só poderiam ser disparadas
pelas laterais, para não atingir as hélices também feitas de madeira. Tentaram
resolver esse problema revestindo as hélices com capas metálicas, mas
perceberam que o piloto corria o risco de ser atingindo se os projéteis
ricocheteassem nelas. Uma surpreendente solução foi alcançada quando
desenvolveram um sistema de disparo em sincronia com a rotação das hélices.
Agora o piloto poderia voar sem a necessidade de um observador para manusear a
metralhadora. As metralhadoras passaram a ser posicionadas na frente do piloto
que as disparava através de um dispositivo no próprio manche, fazendo com que
os projéteis passassem entres as hélices em perfeita sincronia. As
possibilidades de um ataque frontal se tornaram realidade e as estratégias de
ataque se tornaram mais efetivas. Oswald Boelcke foi o principal responsável
pelo desenvolvimento das táticas de
combate aéreo que mudaram radicalmente a função do avião nas guerras, da função
de observação e vigilância para uma das armas mais letais usadas num conflito
moderno.
Boelcke (à esquerda) e Richthofen, examinando um caça britânico |
A Força Aérea Alemã na Primeira Guerra Mundial – A Alemanha não era
uma grande potência armada em relação ao poderio integrado dos ingleses,
franceses e aliados, que eram superiores no
número de combatentes e armamentos. Daí o destaque para as proezas e
heroísmo lendários dos combatentes alemães, principalmente dos ases da aviação
de combate, teoricamente inferiores em número e sempre um passo atrás das
inovações técnicas e estruturais da aviação aliada. Para superar a aparente
desvantagem, os pilotos alemães esbanjavam espírito, força de conjunto e
inteligência estratégica para o combate.
Boelcke recebe a Cruz de Cavalheiro em 03/11/1915 |
Surge o primeiro Ás da Aviação – Antes de seu tornar um temível
piloto de combate, Oswald Boelcke pilotou aviões de reconhecimento tendo seu
irmão Wilhem Boelcke como observador pelo 13º Pelotão de Aviadores. Após 50
missões cumpridas, recebeu a condecoração da Cruz de Ferro junto com o irmão em
1914. A dupla foi desfeita devido à intrigas e rivalidades internas
provavelmente causadas pelo sucesso dos irmãos. Em abril de 1915 Boelcke foi
transferido para a 62 ª Unidade de Reconhecimento e Ajuste de Artilharia
situados em Douai, situado em território francês ocupado pelos alemães. Em
Julho de 1915, os pilotos de combate Oswald Boelcke, Max Immelmann, Otto
Parschau e Jurt Wintgens receberam os primeiros protótipos dos aviões Fokker
M.5K.MG, equipados com metralhadoras Parabellum sincronizadas e refrigeradas a
ar. Em 04 de julho de 1915, Oswald Boelcke, ainda pilotando um avião biposto
consegue sua primeira vitória com seu observador, o tenente Heinz von Wühlisch,
num duro combate contra um avião Morane Parasol sobre a região de Valenciennes,
França. A vitória numa ação específica de combate fomentou a idéia de
desenvolver esquadrões treinados para a interceptação e combate. Em 19 de
agosto de 1915, Boelcke obteve sua primeira vitória solo, derrubando um Bristol
Biplano. Em 03 de novembro foi o primeiro piloto a receber a Cruz de Cavalheiro
com Espadas da Ordem Real da Casa de Hohenzollern.
Max Immelmann, parceiro e rival de Boelcke |
Boelcke, Immelmann e a Pour Le Mérite – Outro piloto que se
destacava na 62ª Unidade era Max Immelmann, que até o final de 1915 obtivera
sete vitórias, contra seis de Oswald Boelcke. Até o final de janeiro de 1916
ambos estavam com oito vitórias no currículo, o que os levou a receber a mais
alta condecoração militar, a Ordem Pour Le Mérite. Em Março de 1916, Boelcke
tornou-se líder da unidade recém formada, a Fliegerabteilung Sivery, comandando
os combates sobre Verdun. Em 18 de junho, Max Immelmann foi abatido e morto em
combate, ele havia alcançado 17 vitórias.
O Kaiser e o herói nacional – Com a crescente fama e popularidade
de Oswald Boelke entre o povo alemão e o temor de perder um exemplo único de
combatente, o Imperador Wilhelm II, Rei da Prússia, chegou a ordenar seu
afastamento dos combates aéreos para preservá-lo de uma morte prematura. O
Kaiser queria utilizar sua capacidade intelectual e experiência adquirida nos
combates na reestruturação da força aérea alemã que ainda estava atrasada em
relação aos avanços tecnológicos alcançados pelos ingleses e franceses. A
influência em terra como no ar de Oswald Boelcke foi decisiva para o progresso
da força aérea alemã.
Boelcke, antes de tudo um cavalheiro |
O desenvolvimento dos caças alemães -
Os aviões Fokker E-III foram finalmente substituídos pelos modelos
Halberstadt e Albatros, ao mesmo tempo em que ocorria um reorganização das
Forças de Combate Aéreo. Foram desenvolvidos estudos que geraram novos
conceitos e inovações táticas de combate aéreo tão revolucionárias que foram
utilizadas até a Segunda Guerra Mundial. O conceito de se formar um esquadrão
com espírito de equipe e cooperação comandado por um líder experiente e carismático,
fez escola.
Espírito de combatente e honradez de cavalheiro – O nobre caráter
de Oswald Boelcke foi reconhecido graças a um incidente em 28 de agosto de
1915. Ao presenciar um avião francês ser abatido e mergulhar no canal próximo à
sua base, Boelcke totalmente equipado para o voo se dirigiu ao local e
mergulhou sem hesitar no canal, salvando o piloto Albert de Place do
afogamento. A família do piloto francês em agradecimento requereu ao governo francês
uma condecoração ao piloto alemão, que foi concedida através do governo da
Alemanha, pelo seu ato de dignidade e bravura através da Rettungsmedaille am
Band (Medalha de Salvamento), em 30 de novembro de 1915.
Boelcke e seus nove mandamentos de combate |
A Dicta de Boelcke – Oswald Boelcke foi pioneiro em desenvolver
táticas revolucionárias para o conflito aéreo, baseado nos muitos combates que
realizou com sucesso. Assim ditou
instruções básicas para serem seguidas
por um piloto de caça:
01 – Antes do ataque, crie ou
certifique-se das condições favoráveis ao sucesso do combate: velocidade,
altitude, superioridade numérica e posicionamento.
02 - Ataque sempre com o sol na retaguarda.
03 – Uma vez iniciado o ataque,
dê continuidade e não o aborte.
04 – Dispare o mais próximo
possível do adversário e somente se o tiver seguro na alça da mira.
05 – Não perca o adversário de
vista.
06 – Em qualquer forma de ataque
é necessária a aproximação pela retaguarda do adversário.
07 – Se o adversário o atacar em
voo de mergulho, não tente desviar-se do ataque. Enfrente-o
08 – Ao sobrevoar linhas
inimigas, mantenha-se orientado e resguarde sua retaguarda para a eventualidade
de um recuo às próprias linhas.
09 – Em caso de ataque com
esquadrilhas: Em princípio os ataques devem ser realizados em grupos de quatro
a seis aviões. Caso ocorrer dispersão dos combatentes, evitar um ataque grupal
a um único adversário.
Boelcke (à direita) e um companheiro da Jasta 2 |
A Esquadrilha Jasta 2 – A Fliegerabteilung Sivery era integrada por
seis caças, sendo a precursora das Jagdstaffel (Esquadrilhas de caça) alemãs
criadas em 1916, que passaram a seguir os conceitos inovadores de Oswald
Boelcke. Após a criação da Jagdstaffel (Jasta) 1, o tenente-coronel Hermann von
der Leith-Thomsen incumbiu a Boelcke a formar a Jasta 2. Os primeiros pilotos
escolhidos por Boelcke foram Manfred von Richthofen (o Barão Vermelho), Erwin
Bohme e Hans Reimann. A Jasta 2 se tornou a unidade de elite da aviação de
combate alemã. No início operavam os Fokker D-II e Halberstadt D-II que foram
substituídos posteriormente pelos mais modernos modelos Albatros D-I e D-II. No
final da guerra a Jasta 2 contava com 20 pilotos, contabilizando um total de
336 vitórias e apenas 44 baixas. O segredo para tantas vitórias era, segundo
Boelcke, manter a disciplina tática do grupo e o espírito de equipe. Ele mesmo
afirmou: “O sucesso da Jagdstaffel 2 nos combates depende da ação e conjunto.
Não importa qual o piloto efetivamente obteve vitória, contanto que a
Jagdstaffel vença o combate.”
Quadrinização do acidente fatal com Oswald Boelcke |
A morte inesperada de Oswald Boelcke – Dois dias após sua 40ª
vitória, no dia 28 de outubro de 1916, Oswald Boelcke e sua esquadrilha partem
para interceptar os caças DH-2 britânicos da 24º esquadrilha da Royal Flying
Corps. Durante a batalha aérea sobre Baupaume, o trem de pouso do caça pilotado
pelo companheiro Erwin Böhme, rasga a asa superior do Albatros D-II de Boelcke.
Com o avião descontrolado, Boelcke ainda consegue aterrissar. Mas o forte
impacto ao solo, lhe causou a morte por traumatismo craniano. Boelcke tinha
apenas 25 anos e já era considerado um mestre da aviação de combate. O velório,
sob um forte comoção popular, se realizou na Catedral de Cambrai, com a
presença de várias personalidades. Manfred von Richthofen, que seria em pouco
tempo conhecido como o temido Barão Vermelho e nomeado o novo líder da Jasta 2,
carregou as medalhas de seu mentor durante o velório. O corpo de Boelcke foi
sepultado dois dias depois no cemitério honorário de Dessau com honrarias
militares.
O corpo de Boelcke ao lado dos destroços |
Funeral de Oswald Boelcke com honrarias militares |
Numa próxima postagem falarei um pouco sobre outro ás da força aérea de combate alemã: Max Immelmann.
Por Eumário J. Teixeira.
Gostei muito! Ótimas informações.
ResponderExcluirObrigado, amigo. Você já conferiu o post "Manfred Von Richthofen - A Lenda do Barão Vermelho" neste blog?
ResponderExcluirParabéns pelo artigo! Sensacional!
ResponderExcluirObrigado, amigo!
ExcluirParabéns pelo artigo! Sensacional !!!!
ResponderExcluirObrigado pelo apoio e incentivo, Gilvan.
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