2 de mai. de 2009

PETER GREEN X ERIC CLAPTON - Quem seria o melhor?

Na segunda metade dos anos de 1960, Londres se habituou com pichações de frases tais como “Clapton is god” por toda a cidade. Traduzindo o que queriam dizer, seria simplesmente que Eric Clapton era “deus tocando guitarra”. Clapton que na época tinha um ego descomunal, adorava tudo aquilo e não fazia a menor questão de repudiar tal blasfêmia. Mas pouco tempo depois da precoce consagração de Clapton, surgiu no cenário do rhythm & blues britânico outro jovem guitarrista que era até um fã de “deus”, digo Eric Clapton; pois pouco tempo depois da manifestação do primeiro, poderia se ouvir e ler coisas do tipo “God is Green”, ou seja, “deus é verde”, entenda-se “Peter Green que é deus”; uma clara resposta à manifestação pró Clapton. Mas Peter ao contrário do “poderoso rival” não tinha o ego inflado, era conhecido pela sua simplicidade e humildade notórias e seu foco principal era fazer música e tocar blues da melhor forma possível. Nas bandas de participou, Clapton se impunha naturalmente como grande guitarrista que foi e é, sendo praticamente o frontman dos grupos em que tocou apesar de que no início de sua carreira não se arriscava nos vocais por insegurança e consciência de sua total incapacidade para tal. Mas ele sempre era o centro das atenções mesmo se ficasse mais recuado nos palcos. Até hoje ele se impõe sem fazer força, quando sobe ao palco mesmo rodeado de superstars, é ele que recebe a maior e mais calorosa aclamação do público. Peter Green, ao contrário, preferia dividir a atenção do público com os companheiros de banda. Apesar de, como Clapton, ter talento e carisma suficientes, além de ter sido um excelente guitarrista e vocalista, ele não ambicionava a adoração dos fãs. No Fleetwood Mac, por exemplo, Green era democrático o bastante para deixar seus outros dois guitarristas, Jeremy Spencer e Danny Kirwan, fazerem seus próprios números, com ele discretamente na base. Ao contrário de Clapton no início, Peter não se exibia, apenas atuava. O amadurecimento de Clapton em relação à música e ao seu modo de atuar veio como tempo. Devido ao seu gênio inconstante, frustou-se em muitos projetos musicais devido à sua insegurança em relação ao que perseguia profissionalmente. Essa indefinição musical não permitia que ele permanecesse por muito tempo numa banda. Assim foi no Yardbirds, Bluesbrakers de John Mayall, Cream, Blind Faith e Derek And The Dominos. Quando descobriu o “caminho da simplicidade” para tocar, cantar e até compor, aquietou-se numa carreira solo de altos e baixos, tentando se desvincular de sua imagem de semi-deus construída no passado. Peter Green, ao que me parece, já chegou com uma proposta que Eric Clapton penou para alcançar. Apesar de um pouco mais jovem, Green se mostrava mais seguro e já sabia o que queria, e provou isso ao substituir o próprio Clapton no John Mayall´s Bluesbreakers. Mais tarde quando deixou Mayall e fundou o Fleetwood Mac, ele já tinha a fórmula mágica para o som de sua banda. E obteve sucesso por muitos anos, pois se integrava com muito feeling ao que fazia. Peter era dono de uma sensibilidade incrível para compor, e transmitia todo o seu sentimento nos seus vocais e lamentos de sua Les Paul. O problema é que ele não soube aliar toda a sua paixão e dedicação pela música a toda aquela grana que ganhava e a sua crescente popularidade. Sentindo-se muito pressionado e finalmente perdido, acabou por sofrer um esgotamento nervoso, abandonando o Fleetwood Mac.

Eric Clapton nasceu em 30 de março de 1945 em Ripley, cidadezinha próxima a Londres, filho de mãe solteira e de pai desconhecido, foi abandonado pela mãe aos dois anos de idade para ser criado pela avó materna. A ausência da figura paterna lhe deixou um enorme vazio e uma crise de identidade que o atormentou por muitos anos, recentemente (em 1998) após muita procura, ele descobriu que seu pai possivelmente se tratasse de um soldado canadense servindo na Inglaterra durante a 2ª Guerra Mundial. Clapton em sua juventude freqüentou uma escola formal de música, mas a partir dos 16 anos descobriu o blues na boemia de Londres. A partir daí não quis saber de outra coisa, se reunia com conhecidos nos fins de semana para trocarem idéias e escutarem os discos de blues recém importados da América. Sua relação com a música negra norte-americana se fez mais forte ao se identificar com a vida de seus ídolos, como o misterioso Robert Johnson que como ele, nunca conheceu o pai e era seu modelo de cantor e guitarrista de blues e Muddy Waters, a quem almejou como o pai que nunca teve. Nas bandas pelas quais passou como The Roosters, Yardbirds, se manteve apenas na guitarra, a partir de John Mayall´s Bluesbreakers se aventurou vez ou outra nos vocais, assim foi no Cream e Blind Faith. Nas suas participações na banda de Delaney & Bonnie de forma mais discreta, obteve total apoio de Delaney Bramlett para iniciar uma carreira solo com mais segurança. Em seguida com a formação de Derek & The Dominos, Clapton mergulhou a fundo no seu amor platônico e não correspondido por Pattie Boyd, na época esposa de George Harrison, dos Beatles. A paixão já era alimentada por muitos anos e para piorar, ele tinha um grande afeto por Harrison. A situação o fez refugiar-se mais e mais no álcool e nas drogas, dos quais se livrou com um tratamento no início dos anos 70 e culminou com seu retorno triunfal em 1973 num grande concerto apoiado por amigos como Pete Towshend do The Who e Stevie Winwood do Traffic e Blind Faith. Sua carreira prosseguiu com alternando gravações de blues, country e até pop, até que se firmou novamente ao lançar o premiado disco “Unplugged” em 1992 e “From The Cradle” em 1995, ambos dedicados à sua maior paixão, o blues. Atualmente Clapton se dedica a promover concertos e tributos aos velhos ídolos que ainda estão vivos, como B. B. King, Buddy Guy e Hubert Sumlin e a gravar e produzir seus próprios trabalhos.

Peter Green, aliás, Peter Allen Greenbaum, nasceu em 29 de outubro de 1946 em Bethnal Green, Londres. Aprendeu por conta própria a tocar guitarra a partir dos 11 anos de idade e aos 15 já tocava profissionalmente. Suas maiores influências no início e que certamente definiram seu estilo foram Hank Marvin do Shadows, B. B. King, Freddie King, Muddy Waters e até músicas tradicionais judaicas. Sua primeira banda foi a Boby Denim & The Dominoes onde tocava clássicos do rock & roll. Em seguida se ingressou numa banda de rhythm & blues, chamada The Muskrats. Logo imigrou para The Tridents, onde tocou baixo e, posteriormente, seguiu para The Peter Barden´s Looners, onde conheceu Mick Fleetwood com quem formaria anos depois o Fleetwood Mac. Em 1966 Eric Clapton deixa o John Mayall´s Bluesbreakers e o mais cotado para substituí-lo seria Peter Green. E ele cumpriu sua missão com muita competência na banda de Mayall, onde exibiu toda sua técnica de guitarrista, compositor e vocalista. E assim, mais experiente e reconhecido, Peter partiu para formar a banda de seus sonhos. Em 1967 lançou o excelente álbum Peter Green’s Fleetwood Mac, seguido de outros bem sucedidos. Tudo parecia estar bem, até que Peter sentindo-se desconfortável com sua vida e pressionado pelas situações impostas pelo showbusiness, retira-se da banda. Presume-se que tudo começou a partir do momento em que passou a sofrer de esquizofrenia, se entregando ao consumo de drogas pesadas como o LSD e ao misticismo religioso, impulsionado talvez pela dificuldade de assimilar sua posição de rockstar com a administração de todo aquele dinheiro arrecadado em concertos, vendas de discos e de outras obrigações contratuais. A música, antes um prazer, tornara-se um mero negócio, um fardo. Conta-se que tentou inclusive doar todos os ganhos da banda para a caridade, o que foi negado pelos outros componentes, fazendo então com que ele se afastasse definitivamente. Green tentou se recuperar posteriormente em carreira solo, mas alternava alguns discos razoáveis com internações psiquiátricas, sofrendo tratamentos até com eletro-choques. Foi um período obscuro em sua vida, descuidou-se do visual, passou a se isolar e morar sozinho enquanto se dizia atormentado por vozes que só ele escutava. Até que alguns amigos mais chegados se aproximaram e o resgataram aos poucos para o convívio social e para a música. Desde 1996 Green fez concertos e gravou regularmente com o Peter Green Splinter Group em parceria com o amigo-protetor e também guitarrista Nigel Watson. Mas suas performances ainda não lembravam o lendário Peter Green do passado, e apesar de às vezes não falar coisa com coisa, de não solar e cantar como antes, seu espírito de bluesman estava intacto e podia-se ver uma chama daquele excepcional artista que um dia tirou suspiros até do mestre B. B. King. Em 2004 Peter deixa o Splinter Group e se muda para a Suécia onde teria se juntado a outro grupo, mas devido a problemas de adaptabilidade com a sua medicação, seus projetos permanecem indefinidos e incertos quanto ao futuro.

Para concluir, é difícil afirmar qual dos dois lendários guitarristas era o melhor, mas uma coisa é certa, ambos se dedicaram ao máximo e fizeram de tudo pela música que tanto amam. Atuaram cada um a seu modo, impondo respeito e admiração por todo o mundo. Souberam superar as dificuldades impostas pelo destino e continuam seguindo a trilha do blues. Triste vai ser o dia em que Eric e Peter não poderem mais tocar para o seu público fiel, mas até lá, vamos curtir os caras pessoal!
 
Eumário J. Teixeira

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