Jim Kelly foi um legítimo representante do movimento da “força negra” ou "poder negro" nos anos de 1970, pelo menos em termos de visual. Com sua vasta cabeleira afro-black power, suas costeletas “a la Elvis Presley” e seu caminhar gingado, Jim Kelly fez escola para os jovens negros nos Estados Unidos que curtiram os personagens vividos por ele nos filmes de artes marciais. Aliás, Jim Kelly, tinha consciência de que ele foi um primeiros atores negros a protagonizarem filmes de ação para o público negro carente de heróis e que os representassem nas telonas. Ele reunia todas as condições para ser bem aceito como um novo astro negro do cinema como Sidney Poitier, Jim Brown, Fred Williamson e Calvin Lockhart. Era um ator razoável direcionado para os filmes de ação do gênero conhecido como “Blaxploitation” (filmes de ação independentes dirigidos às comunidades de periferia com muita música soul e atores negros), pois tinha um carisma natural, um físico de atleta e era realmente um estiloso praticante faixa-prêta de karatê japonês. Assim, faço aqui uma pequena homenagem ao “Black Samurai” Jim Kelly, que junto a Bruce Lee, tanto me inspirou para curtir e praticar artes marciais.
Jim Kelly como o presunçoso karateca Williams |
JIM KELLY – James Milton Kelly,
nasceu em 05 de maio de 1946 em Paris, no interior do Kentucky, nos Estados
Unidos. Muitos achavam que ele teria nascido num bairro violento como o Bronx
de New York, como os ínumeros personagens que representou em seus filmes. Ainda
criança se mudou para San Diego, na Califórnia. Quando rapaz, ganhou uma bolsa
de estudos da Universidade de Louisville, se valendo do seu porte atlético e
1,88 m para se ingressar no time de futebol americano. Mas logo se retirou do
grupo em protesto contra o tratamento racista e discriminatório aos jogadores
negros. Provavelmente se sentindo cada vez mais ameaçado pela onda de racismo que
se propagava pelo país em meados dos anos de 1960, Jim Kelly resolveu aprender
karatê e se formou faixa preta em poucos anos de treinamento. Inicialmente ele
começou a praticar o estilo Shorin-Ryu de karatê, passando a praticar também
outros estilos primitivos de karatê de Okinawa sob o comando dos mestres Parker
Shelton e Gordon Doversola.
Em 1971 chegou a vencer o Quarto Campeonato
Internacional de Karatê de Long Beach, California, na categoria peso médio. Na
época, Jim Kelly já ensinava em seu próprio dojô ou academia no distrito de
Crenshaw de Los Angeles.
Jim Kelly começou a flertar com o
cinema quando passou a ministrar aulas particulares de karatê para o ator negro
Calvin Lockhart que precisava estar em forma para atuar no filme de supense policial “Melinda” em 1972. Ao
aparecer nos estúdios de gravação para checar a performance de seu aluno, Jim
Kelly foi notado pelo diretor negro Hugh A. Robertson. Assim Jim Kelly acabou
por fazer uma “ponta” no filme Melinda.
Bruce Lee coreografando Jim Kelly em Operação Dragão |
No início de 1973, enquanto
selecionavam o elenco para o clássico maior das artes marciais no cinema Operação
Dragão (Enter The Dragon), que consagrou Bruce Lee, os produtores procuravam um
ator negro que tivesse habilidade em artes marciais para compor um trio
multi-racial de heróis no filme, a saber, um chinês (Bruce Lee), um branco
norte-americano (John Saxon) e um negro ou afro-americano. Após a desistência
do ator Rockne Tarkington, Jim Kelly foi imediatamente recomendado e convocado
pelo produtor Fred Weintraub para assumir o papel do personagem Williams, um
karateca de “estilo nada ortodoxo”, carismático, sensual, cool, presunçoso e
cheio de frases de efeito. Quem não se lembra da famosa exclamação de Williams
- “Bullshit, Mr. Han!” - quando é confrontado pelo vilão de Operação Dragão? O
personagem de Jim Kelly morre prematuramente pelas mãos do vilão no filme, mas
sua performance, principalmente nas cenas de luta dirigidas por Bruce Lee, lhe
deram certo destaque. Cada um do trio de heróis que embarcou para o sinistro
torneio na ilha do vilão Han tinha seu motivo oculto para estar lá. Lee (Bruce
Lee) era por vingança, já que Han era um monge shaolin renegado e corrupto
traficante de ópio, que trouxe a desgraça para a sua ordem e que tinha como seu
fiel guarda-costas, O’Hara (Bob Wall), o culpado direto pela morte da irmã de
Lee; Roper (John Saxon) fugia da máfia pois devia muito dinheiro perdido em
jogatinas; Williams (Jim Kelly) estava ali pelo simples prazer de competir e
para provar a si mesmo o quanto era bom.
Jim Kelly detonando em Operação Dragão |
No roteiro o personagem de Williams
morreria num confronto precoce com Han, o que foi decepcionante para o público
em geral, eu mesmo me lembro que fiquei muito decepcionado, preferia que se
fosse para morrer um coadjuvante de Lee, seria melhor que fosse Roper, apesar da
sua simpatia. Pois evidentemente Williams (ou Jim Kelly) tinha um estilo mais
atraente de luta que lembrava Muhammad Ali. Quem sabe não rolou um pouco de discriminação aí? Certamente
já era um absurdo para a época, um norte-americano de origem chinesa como
Briuce Lee ser convidado para ser o “mocinho” do filme, e independentemente de
qualquer situação, Jim Kelly tinha deixado seu recado com muito competência e
carisma.
O Faixa Prêta Jones, o melhor de Jim Kelly |
Após a morte inesperada de Bruce
Lee em julho de 1973, um buraco enorme foi aberto no hall das estrelas dos
“filmes de Kung Fu”. Dai surgiu uma oportunidade para Jim Kelly em 1974, ainda
pegando carona na ótima repercussão de Operação Dragão e na morte de seu principal astro. Robert
Clouse, o mesmo produtor de Operação Dragão, o convida para estrelar seu
próprio filme que se chamaria Jones, o Faixa Preta (Black Belt Jones). A
história do filme gira em torno da máfia que queria comprar as propriedades da
região de um gueto negro a preços irrisórios para um golpe de especulação
imobiliária. Só que Pop Byrd, um velho instrutor de karatê dono de um prédio no
qual morava e ministrava suas aulas, não se dobrou à pressão dos bandidos e acaba
assassinado por isso. Adivinhe quem era o melhor amigo de Pop Byrd? Black Belt
Jones, é claro! Para o azar dos mafiosos; e ainda por cima, a filha de Byrd,
Sidney (Gloria Hendry), surge na trama sedenta de vingança. Foi o melhor filme feito por Jim Kelly, sem
dúvidas.
Em seguida vieram Three the Hard
Way (1974); Golden Needles (1974); Take a Hard Ride (1975), um faroeste com o
trio parada dura, Jim Brown, Fred Williamson e Jim Kelly (que representa um
guerreiro negro criado por índios); Hot Potato (1976) com o personagem “Jones”
de volta; Black Samurai (1977); The
Tattoo Connection (1978), ou Black Belt Jones 2, uma paródia do primeiro filme
filmada em Hong Kong; Death Dimension (1978); The Amazing Mr. No Legs (1981); e
One Down, Two To Go (1982).
Os três filmes do 'trio parada dura': Jim Kelly, Jim Brown e Fred Williamson |
Em Three the Hard Way
(“Implacáveis até o Inferno”, no Brasil) de 1974, Jim Kelly se junta novamente aos astros
negros do gênero blaxploitation, Jim Brown e Fred Williamson; um trio bem
sucedido que tornaria a se reencontrar em One Down, Two To Go (“Revanche de
Sangue”, no Brasil) de 1982. Em Black
Samurai (“O Dragão Negro”, no Brasil) de 1977, Jim Kelly começa uma série de
paródias de si mesmo, um filme de baixo orçamento e ruim, que apesar de tudo
contra se tornou “cult” entre os fãs mais devotos.
Williamson, Kelly e Brown, astros do gênero blaxploitation para o público negro |
Jim Kelly acabou se cansando de
tudo isso, abandonou os filmes de artes marciais e passou a se dedicar ao
circuito senior de Tênis da USTA, esporte que ele curtia e praticava além do
karatê desde meados dos anos de 1970, em Plummer Park, em West Hollywood, Los
Angeles.
Jim Kelly vs. Muhammad Ali. Quem ganharia o confronto? |
Nos anos de 1990, Jim Kelly
reapareceu como coadjuvante em muitos filmes B. Sua última aparição nas telas
foi numa pequena figuração em “Black Ninja”, uma comédia de ação blaxploitation
de 2007. Em 2009, Jim Kelly apareceu numa
convenção de quadrinhos, na Comic-Con de San Diego, na Califórnia, atraindo
muitos fãs.
A outra paixão de Jim Kelly era o tênis |
Ainda em 2009, foi lançado o
filme (misto de comédia e ação) “Black Dynamite” estrelado por Michael Jai
White (que protagonizou Spawn) numa
clara referência e homenagem aos personagens vividos por Jim Kelly nas telonas.
Black Dynamite vive nos anos de 1970, é
um veterano da Guerra do Vietnã e agente da CIA que parte para combater
o crime nos guetos negros após o assassinato de seu irmão. Michael Jai White
confessou que fez questão de copiar todos os trejeitos de Jim Kelly. O filme
ainda rendeu uma série animada em 2011.
Jim Kelly faleceu no dia 29 de
junho de 2013, aos 67 anos, em decorrência de um câncer, segundo informações de
sua ex-esposa Marilyn Dishman. Jim deixou também uma filha, Sabrena
Kelly-Lewis.
Saudades do Black Belt Jones,
Oss!
Jim Kelly curtindo o boneco de Williams |
Por Eumário J. Teixeira.