24 de jul. de 2014

JOHNNY WINTER, O ALBINO MALUCO, MORREU!



 Go Johnny, go, Johnny B. Goode...

O tempo é mesmo implacável, desta vez se foi Johnny Winter, também conhecido como o “albino maluco”, que nos deixou aos 70 anos após uma vida temperada com muito blues, rock, drogas, álcool e muita loucura. Seu comportamento desregrado e intenso não lhe trouxe uma morte prematura como no caso de seus amigos Jimmy Hendrix e Janis Joplin, mas lhe deixou algumas sequelas no organismo; entretanto, lhe foi permitido reagir em relação à sua própria vida e carreira, o que lhe proporcionou a oportunidade de ainda de resgatar e produzir velhos ídolos como Muddy Waters, a quem adotou como um filho adota um pai querido. Johnny inicialmente se caracterizou como um roqueiro carismático e de estilo agressivo, mas após superar uma dura experiência com a heroína se voltou inteiramente para o blues, agora mais sóbrio e concentrado, vivendo e tocando tão somente pelo seu amor incondicional a este gênero musical. Esta é uma pequena homenagem que faço a um tipo de músico, aliás multi-instrumentitista (guitarra elétrica, acústica e slide, mandolim, harmônica) e vocalista, que infelizmente está em extinção, mas precisamente ao guitarrista texano que definiu um estilo ímpar e incendiário que mesclava garra, técnica e feeling tocando ou cantando nada além do bom e velho blues!
Johnny detonando e levando os fãs à loucura com sua Gibson Firebird
Johnny Winter, uma breve biografia John Dawson Winter III nasceu em 23 de fevereiro de 1944 na cidade de Beaumont, no Texas. Viveu no seio de uma família que respirava música já que sua mãe era pianista, cantava muito bem e foi sua principal incentivadora. Sua iniciação musical se deu com o clarinete já aos 5 anos de idade, depois passou para o ukulele (um violãozinho de 4 cordas popular entre os havaianos no séc. XIX) até chegar à guitarra. Em pouco tempo os irmãos Johnny e Edgar, que era tão talentoso e albino como ele, estavam tocando sucessos dos Everly Brothers e ganhando muitos prêmios graças às suas performances em shows e TVs Locais. Os irmãos albinos e banda lançaram o primeiro disco, School Day Blues, quando Johnny tinha apenas 15 anos de idade e chegaram a vender 285 cópias.
A família Winter: Johnny, Edgar e a mamãe, a grande incentivadora
Na juventude dos irmãos Winter se respirava a intolerância racial, mas isso não impedia que os dois branquelas invadissem os bairros negros da sua cidade para curtirem o legítimo blues. O interessante é que os dois irmãos não foram rejeitados ou hostilizados pelos negros, pois deveriam transmitir de alguma forma seu amor legítimo pela música de raiz afro-americana. 
Joãozinho inverno, ou melhor, Johnny the rocker...
Conta a história que em 1962, durante um show de B. B. King no clube Raven, os irmãos albinos Johnny e Edgar eram os únicos de pele clara no recinto. Johnny Winter apenas com 17 anos implorava a B. B. King uma oportunidade para tocar ao seu lado no palco. De tanto perturbar B. B. King acabou cedendo, lhe passou a guitarra e Johnny tocou sendo aprovado por B. B. King e muito aplaudido platéia negra no final de sua apresentação.
As coisas começaram a se encaminhar para Johnny Winter quando ele se juntou ao baixista Tommy Shannon (que tocaria com Stevie Ray Vaughan anos depois) e o baterista Uncle John Turner. Nesta época ele foi convidado pelo guitarrista Mike Bloomfield e Al Kooper para uma participação num show da dupla em 1968 no Fillmore East, em Nova York, que foi registrado no cd lançado em 2003, intitulado Fillmore East: The Lost Concert Tapes 12/13/68, onde após ser anunciado por Bloomfield, Johnny Winter toca e canta uma versão, ao seu estilo, do blues "It's My Own Fault" de B. B. King. Essa sua performance chamou a atenção de representantes da gravadora Columbia. A banda de Winter já fazia por onde e mereceu uma matéria da revista Rolling Stone (que ainda era muito conceituada na época) e ainda em 1968 é gravado o interessante album The Progressive Blues Experiment pela Sonobeat que seria lançado no ano seguinte, com uma boa versão de “Help Me” de Sonny Boy Williamson II e a pulsante “Mean Town Blues”.
Já o primeiro album oficial, denominado apenas Johnny Winter, com as participações dos bluesmen Willie Dixon no baixo acústico e Walter “Shakey” Horton na gaita, foi lançado em 1969 pela Columbia e continha a faixa que se tornou uma assinatura de Johnny, “Good Morning Little School Girl” de Sonny Boy Williamson I. Ainda neste ano, o trio passou a se apresentar em diversos festivais de rock, como o lendário Woodstock; sendo lançado também o segundo trabalho também pela Columbia chamado Second Winter, com Edgar Winter nos teclados e alto saxofone, destacando neste trabalho as faixas “Johnny B. Goode” de Chuck Berry e “Highway 61 Revisited” de Bob Dylan. 
And, a super banda que proporcionou a Johnny uma parceria produtiva com Rick Derringer (ao seu lado)
Em 1970 com uma nova formação chamada “And” que contava com o compositor e talentoso guitarrista Rick Derringer, o baixista Randy Jo Hobbs, e o irmão de Rick, o baterista Randy Z (‘Z’ de Zehringer que vinha de Derringer), foi lançado o album Johnny Winter And (Columbia), que continha a famosa “Rock and Roll, Hoochie Koo” de autoria de Rick Derringer. Alguns dizem que “Rock and Roll, Hoochie Koo” foi determinante para delinear o estilo de Johnny Winter.
Nessas alturas, Johnny já não era um anônimo no mundo do rock e conseqüentemente as pressões vieram, junto com as drogas (principalmente heroína) e álcool em excesso. Se afundando cada vez mais, ele tentou levar sua vida de rock star aos trancos e barrancos, gravando e fazendo shows movido pelo vício até que resolveu se internar para se “limpar” de vez das drogas. 
Johnny Winter com os amigos Jimi Hendrix e Janis Joplin
Mas qual roqueiro que se preze não se lembra do discaço ao vivo ainda pela Columbia, Live – Johnny Winter And (1971) que continha versões vigorosas de “Good Morning Little School Girl”, “It’s My Own Fault” e as incendiárias “Jumpin’ Jack Flash” dos Stones e “Johnny B. Goode” de Chuck Berry?
Em 1973 ele ressurge revigorado e com um novo disco, Still Alive And Well (ainda vivo e bem), um sucesso total de público e crítica, que continha as faixas “Rock Me Baby”; “Can´t You Feel It”, “Rock & Roll” e ainda “Silver Train” e “Let It Bleed” dos Rolling Stones. Do Still Alive and Well ainda participaram Rick Derringer (guitarra), Randy Hobbs (baixo), contando ainda com Richard Hughes (bateria), Todd Rundgren (teclados) e Jeremy Steig (flauta). A partir daí  a imagem do roqueiro doidão foi se apagando aos poucos e ele foi se tornando um bluesman mais sóbrio e pontual.
Johnny Winter com seus principais mentores, B. B. King e o lendário Muddy Waters ao lado de Eric Clapton
No final da década de 1970 Johnny Winter se volta para um projeto especial, recuperar a carreira de seu grande ídolo no blues, Muddy Waters. Assim ele começa a produzir os discos do velho bluesman do Mississippi (a quem considerava como um pai) pelo seu selo Blue Sky. Os trabalhos foram indicados ao Grammy e três deles foram premiados. Os discos produzidos pela Blue Sky foram Hard Again (1977), I’m Ready (1978), Muddy “Mississippi” Waters - Live (1979) e King Bee (1980).
Johnny Winter ainda produziu o disco homônimo da banda de south rock, Thunderhead, em 1975; e o album Whoopin’ do gaitista Sonny Terry, em 1984.
Dois dos maiores guitarristas do blues rock texano, Johnny Winter e Stevie Ray Vaughan
Um trabalho interessante foi Together (Blue Sky - 1976), em parceria com seu irmão Edgar Winter no qual a dupla caprichou num disco ao vivo destilando versões interessantes de clássicos da soul music como "Harlem Shuffle" (gravada pelos Stones); "Soul Man" (Sam & Dave); "You've Lost That Lovin' Feelin'" (sucesso de Elvis Presley); um medley de clássicos do Rock & Roll como "Jailhouse Rock", "Reelin' And Rockin'" e "Good Golly Miss Molly"; e mais R&B e soul com "Let The Good Times Roll" e " Mercy Mercy".
Edgar & Johnny Winter - Together: Clássicos do soul, rock & roll e R&B ao vivo

Com o passar dos anos, Winter se entrega mais ao blues lançando disco memoráveis pela sua própria gravadora Blue Sky e também pela Alligator de Bruce Iglauer, tais como o ganhador do Grammy, Nothin’ But The Blues (Blue Sky - 1977) e White, Hot  & Blue (Blue Sky - 1978) com Jon Paris no baixo e Bob Torello na bateria; e após a dolorosa morte de Muddy Waters em 1983, Guitar Slinger (Alligator - 1984) e Third Degree (Alligator - 1986) com John B. Gayden no baixo e Casey Jones na bateria.
A seguir, pelo selo Pointblank, os memoráveis Let Me In (1991) e Hey, Where’s Your Brother? (1992). Sem lançar um disco por 5 anos, sai finalmente pela Virgin Records, Live In NYC ’97 e logo após outro longo intervalo de quase 7 anos sai, I’m A Bluesman (2004), que foi indicado ao Grammy, todos os quatro últimos citados com Jeff Ganz ou Mark Epstein no baixo e Tom Compton na bateria.
Johnny Winter, agora para sempre na galeria do blues rock
O penúltimo trabalho de Johnny foi, Roots, lançado em 2011, onde o guitarrista texano retorna às raízes e ao blues clássico que tanto o influenciou, acompanhado por uma banda integrada por Paul Nelson (guitarra), Scott Spray (baixo), Vito Liuzzi (bateria), Mike Dimeo (teclados),  Joe Meo (saxofone) e Don Harris (trompete), tendo ainda como convidados Warren Haynes, Susan Tedeshi e Derek Trucks nas guitarras e seu irmão Edgar Winter no Saxofone.
Estava para sair do forno em 2014, o CD Step Back pela Megaforce, um novo trabalho com participações de Eric Clapton, Ben Harper, Billy Gibbons (ZZ Top), Leslie West (Mountain), Joe Perry (Aerosmith), entre outros. O lançamento é previsto para 2 de setembro deste ano. Johnny não estará lá infelizmente, seu estado de saúde já era precário nos últimos anos, pois aparecia nos palcos com um andar curvado e apoiado por assistentes e se apresentava sentado durante todo o show, direcionando seus olhos apenas para a sua fiel guitarra, como se constatou, por exemplo, nas suas apresentações no Crossroads Guitar Festival de Eric Clapton, em 2010.
Winter foi achado morto e sozinho num quarto de hospedaria em St. Gallen, próximo a Zurique, na Suiça, no último dia 16 de julho de 2014 aos 70 anos de idade após ter se apresentado dois dias antes no Cahors Blues Festival na França. Mas apesar de toda a sua fragilidade física agravada por complicações pulmonares decorrentes do tabagismo, já que ele fumava desde os 15 anos de idade, Johnny estava em plena turnê pela Europa e planejava outra pelos Estados Unidos a partir de Agosto de 2014 e possivelmente shows pelo Brasil. Ele se foi e deixou a esposa Susie Winter, com quem se casou em 1992.
Johnny e Edgar Winter, os irmãos albinos destinados ao rock & roll
Johnny Winter teve o seu talento nato reconhecido ainda em vida, em 1988 foi introduzido no Hall of Fame do Blues, teve ao longo da carreira vários de seus discos indicados ao Grammy, conquistando troféus e foi classificado na 63ª posição na relação dos “100 Maiores Guitarristas de Todos os Tempos” da revista Rolling Stone. O albino esquio e magrelo, de cabelos longos e esbranquiçados que nos anos de 1960 e 1970 empunhava a lendária Gibson Firebird, também se rendeu ao leve modelo Erlewine Laser nas últimas décadas, se tornando um dos mais vibrantes e inovadores guitarristas do blues rock por quase 50 anos.
A única turnê que Johnny Winter fez ao Brasil foi em abril e maio de 2010, agraciando as cidades de Curitiba (PR), Porto Alegre (RS), Rio de Janeiro (RJ) e São Paulo (SP) com únicas apresentações aos 66 anos idade.
Obrigado por tudo e vá em paz Johnny, e que Deus tenha misericórdia de você e de todos que estão para se juntar à Ele à espera do juízo final. Go, Johnny, go...

Discografia Básica de Johnny Winter:
Galeria dos principais cds de Johnny Winter
  • The Progressive Blues Experiment (Sonobeat - 1968)
  • Johnny Winter (Columbia - 1969)
  • Second Winter (Columbia - 1969)
  • Johnny Winter And (Columbia - 1970)
  • Johnny Winter And Live (Columbia - 1971)
  • Still Alive And Well (Columbia - 1973)
  • Saints And Sinners (Columbia - 1974)
  • John Dawson Winter III (Blue Sky - 1974)
  • Captured Live! (Blue Sky - 1976)
  • Together with Edgar Winter (Blue Sky - 1976)
  • Nothin' But The Blues (Blue Sky - 1977)
  • White Hot And Blue (Blue Sky - 1978)
  • Raisin' Cain (Blue Sky - 1980)
  • Guitar Slinger (Alligator - 1984)
  • Serious Business (Alligator - 1985)
  • Third Degree (Alligator - 1986)
  • The Winter Of '88 (MCA - 1988)
  • Let Me In (Point Blank - 1991)
  • Hey, Where's Your Brother? (Point Blank - 1992)
  • Live In NYC '97 (Virgin - 1998)
  • I'm A Bluesman (Virgin - 2004)
  • Roots (Megaforce - 2011)
  • Step Back (Megaforce - 2014 – Póstumo a ser lançado)
 Por Eumário J. Teixeira

2 comentários:

  1. Grande texto, cara! Muito foda! Tem uma biografia dele, que dizem que é fodona, mas ainda não tem por cá em português.

    Abração

    * Uma dica de leito, muda o fundo do blog. ta horrível pra ler.

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