31 de jan. de 2010

CLINT EASTWOOD – ENTRE O COLT E O PIANO


Quando se fala em Clint Eastwood, a imagem que nós, “quarentões”, normalmente mentalizamos, é a do pistoleiro misterioso e sem nome, de poucas palavras e imperdoável. O personagem de “bang bang spaghetti” se tornou padrão para Clint e seus incontáveis fãs, que como eu, não poderia aceitá-lo, a princípio, de outra forma.
Mas Clint Eastwood ao longo de sua vasta, produtiva e consagrada carreira artística não se limitou apenas a interpretar personagens durões no cinema. Além de interpretar, ele também dirigiu e produziu seus próprios filmes e documentários. Poucos sabem que ele também é músico amador nas horas vagas, toca piano e chegou a gravar alguns álbuns de jazz, que é o seu gênero musical favorito, além de apreciar também o blues e a country music e ter uma enorme discoteca em sua casa.
Mas o cinema e a música ainda era pouco para ele que partiu com tudo para a política, onde representando o partido republicano dos EUA chegou a ser eleito prefeito na cidadezinha de Carmel, na Califórnia.
Como um fã fiel do artista, que foi considerado o sucessor de John Wayne e um dos últimos e legítimos representantes do cinema-ação, pretendo a seguir, resumir o que foi sua cinematográfica e pessoal, numa homenagem sincera ao “velho Clint”.

Biografia Clinton Eastwood, Jr. nasceu em 31 de maio de 1930 em San Francisco, na Califórnia (em plena Depressão), filho de Clinton Eastwood e Margareth Ruth (1909-2006). 
Clint tem ascendência escocesa, inglesa, alemã e irlandesa. Sua família era de classe média e protestante. Como seu pai, Clint trabalhou em diversas atividades por toda costa oeste norte-americana. Clint inicialmente sonhou com a carreira de cantor country, chegando a se matricular numa escola para compositores, sem sucesso. Ironicamente, mais tarde o seu estrondoso sucesso nas telas lhe abriu as portas para se dedicar paralelamente à música. Em 1949 se formou na universidade de Oakland, mais por méritos esportivos do que por estudos. Mesmo formado trabalhou como atendente em um posto de gasolina, foi bombeiro e tocou piano em um bar de Oakland. Em 1950 ao ser convocado para servir ao exército, seu avião cai em São Francisco. Gravemente ferido se livrou da Guerra da Coréia.
Década de 1950 – Sua carreira cinematográfica se iniciou na década de 1950. Fez pequenas aparições em filmes de baixo orçamento como Revenge Of The Creature, Tarantula e Francis In The Navy, todos realizados em 1955. Em 1958 consegue seu primeiro papel oficial no filme Ambush At Cimarron Pass (O Grito de Guerra dos Apaches), o qual considerou o pior filme que tinha feito. Em 1959 é convidado a atuar junto a James Garner, na série de western para TV intitulada Maverick. Animado, Clint se dedica a outra série de western chamada Rawhide pela rede CBS. Em Rawhide, que ficou no ar de 1959 a 1966, Clint atuou ao lado de Eric Fleming, que fazia o personagem principal, apesar de Clint naturalmente roubar a cena. 


O seriado também foi importante para Clint, já que ele apreciava o modo de dirigir de Ted Post, o que lhe faria passar para trás das câmeras um pouco mais tarde. Na época Clint classificaria seu personagem do seriado, Rowdy Yates, como “o idiota das planícies”. De qualquer forma foi em Rawhide que ele começou realmente a se fazer notar.

Década de 1960 – No início da década de 1960, mais precisamente em 1963, Clint chega à Itália a convite de Sergio Leone, um diretor ainda não tão famoso, que o convida para interpretar um misterioso pistoleiro sem nome, típico do western spaghetti, ou seja, bang bang versão italiana. Seguiu-se a trilogia que lançou definitivamente Clint Eastwood para o estrelato: For A Fistfull Of Dollars (‘O Magnífico Forasteiro’ ou ‘Por um Punhado de Dólares’ -1964); For A Few Dollars More (‘Por um Punhado de Dólares a Mais’ - 1965); e The Bad, The Good, And The Ungly (‘Três Homens em Conflito’ ou ‘O Mal, o Bom, e o Feio’ - 1966). 

Por um Punhado de Dólares

Sobre o desempenho de Clint e sua qualificação para o personagem que lhe caiu tão bem, Sergio Leone disse: “Eu gosto de Clint Eastwood porque ele tem somente duas expressões faciais. Uma com o cigarro na boca e outra sem”. A verdade é que seu carisma natural, sua presença física e sua inconfundível caminhada, aliado ao seu ar sonolento e aparentemente alheio, bastavam a Clint para preencher uma cena. Em seguida Eastwood e Leone rompem o “namoro” por causa de questões contratuais.
A série Rawhide é cancelada em 1967 e Clint parte novamente para o cinema com Hang ‘em High (A Marca da Forca) no mesmo ano. Era um western produzido nos EUA e dirigido por Ted Post, mas influenciado levemente pelo “spaghetti”, mas que não fica devendo muito aos anteriores realizados na Itália. Hang ‘em High foi o primeiro filme produzido da Malpaso, empresa de produção fundada pelo próprio Clint que já almejava sua independência.
Em Where Eagles Dare (O Desafio das Águias - 1968), um filme baseado numa missão aliada realizada na 2ª Guerra Mundial, Clint dividiu o papel principal com o já consagrado Richard Burton. Ainda em 1968 estrelou o western urbano dirigido por Don Siegel, chamado Googan´s Bluff (Meu Nome é Coogan). Neste Clint fazia o papel de um xerife caipira (Walt Coogan) que tenta impor sua lei na grande New York. O filme causou polêmica pelas cenas de violência e foi o início da parceria de mais de dez anos de Eastwood e Siegel.

Década de 1970 – No começo dos anos de 1970, o filme ambientado na 2ª Guerra Mundial, Kelly’s Heroes (Heróis por conta Própria – 1970) e o western dirigido por Don Siegel, Two Mules For Sister Sara (Os Abutres têm Fome - 1970) ao lado de Shirley MacLaine, foram uma combinação de ação e comédia. Explorou também o drama e o suspense em The Beguiled (O Estranho que Nós Amamos – 1971), dirigido por Siegel; e em Play Misty For Me (Perversa Paixão – 1971), finalmente estréia como diretor e tem o papel principal no qual interpreta um radialista perseguido por uma fã. 

Perversa Paixão - 1971

Em seguida, estoura um dos maiores sucessos de Clint Eastwood no cinema, Dirty Harry (Perseguidor Implacável - 1971), dirigido novamente por Siegel. Neste filme policial, Clint encarnava um inspetor durão de San Francisco, Harry Callahan. Dirty Harry gerou uma seqüência de filmes com o mesmo personagem, que lembrava aquele justiceiro de bang bang à italiana vivendo na época errada, sendo forçado a trocar seu colt 45 pela magnum 44. Assim vieram Magnum Force (Magnum 44 – 1973), dirigido por Ted Post; The Enforcer (Sem Mêdo da Morte – 1976), sob direção de James Fargo; Sudden Impact (Impacto Fulminante – 1983), dirigido pelo próprio Clint; e The Dead Pool (Dirty Harry na Lista Negra – 1988), dirigido por Buddy Van Horn. A série de 5 episódios foi um sucesso sem precedentes. E pensar que o papel de Dirty Harry (Harry, o sujo) foi recusado por Frank Sinatra e Paul Newman.
De volta com tudo ao bang-bang, ele interpreta Joe Kidd (Joe Kidd) em 1972 e High Plains Drifter (Pistoleiro do Diabo - 1973), onde ressurge com o personagem do justiceiro sem nome. Em The Outlaw Josey Wales (Josey Wales, o Fora da Lei - 1976), Clint ao meu ver, inspirou o surgimento do personagem de quadrinhos Jonah Rex. Clint interpretou e dirigiu os dois últimos. 


Em 1977, estrelou ao lado de Sondra Locke, The Gauntlet (Barreira de Fogo), onde interpretou um policial que deveria escoltar uma prostituta de Las Vegas até Los Angeles, para testemunhar contra um assassino.
Em 1978, estrelou Every Which Way But Loose (Doido para brigar, Louco para amar), uma comédia com ação onde ele interpreta a história de um caminhoneiro que lutava clandestinamente por dinheiro apostado nas ruas. Clint tinha como coadjuvante no filme um orangotango treinado. O filme foi um sucesso de público e crítica, acabando por render uma seqüência, Any Which Way You Can (Punhos de Aço) em 1980.
Clint fechou a década de 1970 com Escape From Alcatraz (Fuga de Alcatraz – 1979), no qual interpretou o presidiário Frank Morris, baseado na vida do fugitivo que realmente existiu e que após estudar detalhadamente e planejar a fuga perfeita, escapou em 1962 do famoso presídio ilhado que até então era de segurança máxima. Ele nunca foi recapturado e o FBI alegou que ele possivelmente teria se afogado na travessia a nado. O que é certo é que Alcatraz foi desativada pouco depois do incidente.

Década de 1980 – Em 1982, Eastwood foi a estrela principal, diretor e produtor de Firefox, que se baseava em torno de um avião espião norte-americano e a guerra fria. No final do mesmo ano produziu ‘Thelonius Monk: Straight, No Chaser’, um misto de filme e documentário, essencial para os todos os amantes do jazz, onde retratava a vida de Thelonius Monk, o saudoso e excêntrico pianista do jazz. 

Documentário sobre o pianista de jazz, Thelonius Monk

Seguiram-se os filmes Tightrope (Um agente na Corda Bamba – 1984) de sua produção, e City Heat também em 1984, onde dividiu o estrelato com Burt Reynolds. No ano seguinte Clint reviveu o gênero western para o cinema, um clássico ao meu ver, denominado Pale Rider (O Cavaleiro Solitário – 1985), filme que produziu, dirigiu e interpretou um pastor pistoleiro. Em Heartbreak Ridge 1986), produz e dirige o filme onde também interpreta um Sargento que prepara recrutas para a invasão de Granada. Volta-se para o jazz em Bird (Fim do Sonho – 1988), com sua direção e produção, no qual retrata a vida do lendário saxofonista de jazz, Charlie “Bird” Parker. Bird foi indicado para a Palma de Ouro no Festival de Cannes.

Década de 1990 – Em 1990 foi lançado White Hunter Black Heart (Caçador Branco, Coração Negro) o qual produziu, dirigiu e interpretou um personagem baseado no excêntrico cineasta John Houston que era obcecado pela caça. Em1992 Clint produziu, dirigiu e estrelou seu último western, Unforgiven (Os Imperdoáveis) onde fez o papel de um pistoleiro aposentado. Foi, talvez, a despedida do ator com chave de ouro do gênero que o consagrou nas telas. 

Clint no Os Imperdoáveis, seu último bang-bang?!

O filme co-estrelado por Gene Hackman, Morgan Freeman e Richard Harris foi sucesso de bilheteria, sendo nomeado para nove oscars e ganhando quatro, incluindo melhor filme e melhor diretor para o próprio Clint. Seguiram-se em 1993, com sua interpretação, direção e produção, In The Line Of Fire (Na Linha de Fogo) e A Perfect World (Um Mundo Perfeito), onde contracena com Kevin Costner.
Baseando-se num best-seller, Clint Eastwood produziu, dirigiu e estrelou junto à consagrada atriz Meryl Streep, o romance The Bridges of Madison County (As Pontes de Madison-1995), outro filme que foi um sucesso de bilheteria. Ainda em 1995, produziu The Stars Fell On Henrietta. Em 1997 foi diretor em Midnight In The Garden Of Good And Evil (Meia Noite no Jardim do Bem e do Mal) e estrelou como também dirigiu Absolute Power (Poder Absoluto), um suspense co-estrelado por Gene Hackman, Ed Harris e Dennis Haysbert. Em 1999, veio True Crime (Um Crime Real) com sua produção e direção que estrelou junto a Isaiah Washington, um filme de baixo orçamento, mas que obteve grande bilheteria.

Década de 2000 – Em 2000, interpretou, dirigiu e produziu, Space Cowboys (Cowboys do Espaço) estrelando ao lado de Tommy Lee Jones, Donald Sutherland e James “Maverick” Garner. Sobre uma equipe de veteranos da Nasa que tinha a missão de salvar um satélite russo, antes que ele caísse na Terra.
Em 2002 realizou Blood Work (Dívida de Sangue), que também dirigiu e interpretou um agente do FBI que caçava um psicopata.
Em 2003 produziu e apresentou um documentário da série dedicada à comemoração dos 100 anos do Blues, dirigida por Martin Scorcese. No documentário denominado Piano Blues, Clint apresenta e entrevista feras do piano blues como Ray Charles, Jay McShann, Doctor John e o pianista de jazz Dave Brubeck.

Clint e Ray Charles em Piano Blues
Ainda em 2003, dirigiu e produziu Mistic River (Sobre Meninos e Lobos), pelo qual foi indicado para melhor diretor. Em 2004 aos 74 anos, estrelou, dirigiu e produziu, Million Dollar Baby (Menina de Ouro) que lhe rendeu os oscars de melhor filme, melhor diretor para o próprio Clint, melhor atriz para Hillary Swank e melhor ator coadjuvante para Morgan Freeman. Clint foi indicado para melhor ator pelo mesmo filme.
No ano de 2006, Clint dirigiu dois filmes que abordava a batalha de Iwo Jima na Segunda Guerra Mundial. O primeiro foi Flags For Our Fathers (A Conquista da Honra) no qual focava o soldado que norte-americano que ergueu a bandeira dos EUA no topo do monte Suribachi, e o segundo, Letters From Iwo Jima (Cartas de Iwo Jima) sobre as táticas das forças japonesas na batalha e dos relatos contidos nas cartas escritas às suas famílias. Os filmes foram indicados para melhor diretor e melhor filme por Cartas de Iwo Jima.
Em 2008, aos 78 anos, o velho e incansável Clint Eastwood dirige Changeling (A Troca), estrelado por Angelina Jolie. No final do mesmo ano apresenta o excelente Gran Torino, onde interpreta um sujeito idoso e veterano de guerra, rabugento e racista que acaba por se envolver com uma família de imigrantes asiáticos graças a uma tentativa de roubo do seu carro, um Gran Torino, modelo clássico dos anos 70. O filme foi bem acolhido pela crítica, mas não lhe rendeu premiação pela academia.
No final do último ano, foi realizado Invictus (2009), sob a direção de Clint Eastwood. No elenco principal estão Morgan Freeman, Matt Damon e Scott Eastwood (filho de Clint e Maggie Johnson, nascido em 1986). 

Clint dirigindo Freeman e Damon em Invictus

O filme é sobre a tentativa de Nelson Mandela (Morgan Freeman) unir o povo sul-africano (negros e brancos) após sua posse em 1994, através de um campeonato mundial de rugby realizado em 1995 na África do Sul. E para isso conta com a ajuda do capitão da seleção sul africana François Pienaar (Matt Damon). O roteiro é do sul- africano Anthony Peckham, baseado no livro Playing The Enemy, de John Carlin.
Espero que tenham gostado da minha homenagem à Clint, procurei focar mais o seu lado artístico do que o pessoal, mas ainda em tempo, é sabido que ele foi casado duas vezes, tem cinco filhas e dois filhos, de cinco mulheres diferentes. Sua atual esposa é Dina Ruiz, sendo que viveu com a atriz Sondra Locke de 1976 a 1986, sem terem filhos.
Eastwood foi prefeito de Carmel-By-The-Sea no estado da Califórnia, uma cidade destinada à comunidade artística. Eleito, Clint procurou defender a preservação do meio ambiente local e era contra o desenvolvimento da cidade por empresas locais. Ele é membro do partido republicano desde 1951, apoiou Richard Nixon em 1968, votou para Arnold Schwarzenegger para governador da California em 2003 e 2006, e se descreve como libertarista.
Chegou a ser publicado pelo jornal inglês Daily Express uma declaração de Clint que Gran Torino seria sua última atuação como ator. Será mesmo? Espero que não, pois apesar de Clint estar atualmente com nada menos com 80 anos de idade e não precisar provar mais nada a nenhum crítico especializado, seus fãs, como eu, esperam dele sempre alguma boa surpresa. Vida longa ao velho mestre, Clint Eastwood!
Obs.: Como foi citado, Clint Eastwood também se aventurou pela música, aqui alguns títulos registrados de sua conquista:

Discografia

• "Unknown Girl" (single, 1961)
• "Rowdy" (single)
• "For You, For Me, For Evermore" (single)
• "Rawhide's Clint Eastwood Sings Cowboy Favorites" (LP)
• "Paint Your Wagon" (Banda sonora)
• "Kelly's Heroes" (Banda sonora)
• "Barroom Buddies" (single, 1980) com participação de Merle Haggard
• "Cowboy in a Three Piece Suit" (single, 1981)
• "Make My Day" (single, 1984) com T.G. Sheppard
• "Eastwood After Hours: Live At Carnegie Hall"
• "Gran Torino" (single, 2009) 

Por Eumário J. Teixeira.